Luís Nobre Guedes: Interesse externo mostra que “imagem do país está a mudar”

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A Andersen, multinacional norte-americana de advocacia, entrou esta semana em Portugal, através da integração do escritório de Luís Nobre Guedes.

O mercado português conta desde esta semana com mais uma firma de advocacia multinacional. Chama-se Andersen Tax & Legal e chegou ao nosso país através da integração do escritório do advogado Luís Nobre Guedes. Segundo o próprio, tal facto só foi possível pela dimensão ibérica que a sua sociedade ganhou, após a parceria estabelecida com a espanhola

Olleros. Ao Negócios, Nobre Guedes vê este tipo de interesse externo pelo país como um bom sinal. “Há dois ou três anos, eventualmente, isto não seria possível. Hoje, a imagem de

Portugal está a mudar”, afirma.

Que interesse tem uma sociedade de advogados com a dimensão da Andersen Global num pequeno mercado como o português?

Tenho perfeita noção das nossas limitações. A minha convicção é de que esta ligação só se tornou possível porque previamente fomos capazes de fazer uma parceria ibérica [com a sociedade de advogados espanhola Olleros, que integrou também agora a Andersen]. A Península Ibérica tem cerca de 56 milhões de habitantes. Tem já alguma expressão. Depois a nossa presença em África, no Brasil e na América Latina faz com que os dois países ibéricos, em conjunto, ganhem significado em termos de estrutura global.

E para a sociedade Nobre Guedes, Mota Soares & Associados; o que representa a integração nesta sociedade de origem norte-americana?

Representa uma aposta profunda da nossa sociedade numa cultura internacional. O primeiro aspecto importante que é preciso reter é que a Andersen não é uma “network”, em que os responsáveis de diferentes firmas se reúnem de seis em seis meses.

O que é que a diferencia?

A Andersen nasceu em 2014 para, por convicção de muitos ex-sócios e responsáveis da Arthur Andersen, se tornar uma sociedade de advogados global. Passados três anos, já está em 21 países de quatro continentes e vai continuar a crescer.

A Arthur Andersen, então uma das chamadas “big five” da auditoria, extinguiu-se na sequência do caso Enron. Essa herança não pesa sobre a marca Andersen?

Esse caso pertence ao passado. Hoje em dia, a Andersen nada tem que ver com auditoria ou consultoria económico-financeira. Rigorosamente nada. Nada disso afectou minimamente a ideia de todos quantos estiveram ligados à Arthur Andersen, de que foi uma estrutura com qualidades excepcionais. Isso continua totalmente intocável.

Portugal tem de assumir que o seu peso específico numa economia globalizada está na melhor inserção possível em termos ibéricos.

Esta integração permite-vos manter autonomia ao nível do trabalho que desenvolvem? Está assumido que o que se pretende é que, por ora, exista uma associação de firmas, mas o que pretende num futuro próximo é que seja uma única firma, conhecida em todo o mundo como Andersen Tax & Legal. Todo o esforço que será feito vai no sentido de que, tão depressa quanto possível, seja uma única firma, com um único nome e em que haja uma partilha total de práticas e até de resultados. Para nós, é uma mudança total relativamente ao que éramos antes. Mas estamos aqui porque queremos.

Todos os sócios do escritório português passam a sócios da firma norte-americana?

Exactamente. Trata-se de uma integração total. Não é só minha, mas de toda a firma.

Para os clientes, o que é que representa esta nova realidade?

A possibilidade de, a nível nacional, terem acesso a práticas que estão testadas como sendo do melhor que há. A nível internacional, todos os clientes que pretendam apostar ou que tenham apostado no desafio da internacionalização, podemos passar a ser um parceiro muito interessante, porque há esta noção desta firma global e, portanto, não é apenas indicar ao cliente um escritório num país estrangeiro em que nós confiemos.

O que é mais? Qual é o real valor acrescentado?

É dizer que esta é uma firma que está em todos os países e que responde da mesma forma em todos os países. Nesse aspecto, podemos ser parceiros muito úteis, porque a internacionalização das empresas é habitualmente um processo complicado e moroso.

Esta integração será também sinónimo de mais facturação para o escritório em Portugal? Espero que sim. Isto dá-nos oportunidade de contactar com  outras realidades com que até agora não podíamos contar. Esperamos que seja positivo. Hoje, acabados de fazer esta integração, e apenas pelas relações que fomos mantendo ao longo deste processo, já temos exemplos concretos de clientes que hoje nos procuram e antes não procuravam.

A minha convicção é de que esta ligação [à Andersen] só se tornou possível porque previamente fomos capazes de fazer uma parceria ibérica.

Recentemente entrou no mercado português uma sociedade de advogados multinacional [DLA Piper]. Através do seu escritório, chegam agora ao nosso país os norte-americanos da Andersen Global. Que significado atribui a este tipo de apostas?

Como diria o professor Marcelo [Rebelo de Sousa], é bom sinal para Portugal. Há dois ou três anos, eventualmente, isto não seria possível. Hoje, a imagem de Portugal está a mudar. Aquilo que penso é que Portugal tem de assumir que o seu peso específico numa economia globalizada está na melhor inserção possível em termos ibéricos. Os portugueses não podem melindrar-se pelo facto de alguns centros de decisão hoje poderem estar situados em Madrid. Não é drama nenhum.

Há quem critique a deslocalização de centros de decisão. Não é disso que se trata? Não há deslocalização alguma. Considero que é perfeitamente normal que haja uma racionalização de estruturas. Não faz muito sentido que haja conselhos de administração diferentes num grupo que está simultaneamente em Espanha e em Portugal.

Esta afluência de “players” estrangeiros ao mercado português dos serviços jurídicos e a integração de escritórios nacionais é uma tendência para continuar?

As pessoas vão estar atentas a esta nossa experiência, que só daqui a alguns anos poderá ser avaliada. Se for, como espero que seja, um projecto de sucesso, outras poderão interessar-se. Agora, nós fizemos um percurso. Vejo com alguma dificuldade uma firma global que escolha um escritório em Espanha que não tenha nada a ver com Portugal.

Corolário de estratégia seguida há quatro anos”

Luís Nobre Guedes, desde esta semana sócio da Andersen Tax & Legal, afirma ao Negócios que a integração da sua sociedade pela firma norte-americana é “o corolário de uma estratégia que vinha a ser seguida há cerca de quatro anos”.

A estratégia referida deu os primeiros passos através de uma parceria estabelecida com a sociedade de advogados espanhola Olleros – agora também integrada pela Andersen -, porque, na perspectiva de Nobre Guedes, era importante “funcionar num espaço mais alargado”, que envolvesse não só Portugal, mas também Espanha e os países com que ambos mantêm relações históricas e culturais mais próximas, nomeadamente em África e América Latina.

“Sempre tivemos a convicção de que fôssemos capazes de construir isso, teríamos as portas abertas a que uma estrutura global pudesse ter interesse numa parceria que conseguíssemos fazer a nível ibérico”, explica, dando assim nota do percurso que a sua sociedade fez até chegar à realidade actual.

Refira-se que a Nobre Guedes, Mota Soares & Associados junta-se à Andersen com um grupo de cerca de 30 advogados, que desenvolvem a sua actividade em ramos de direito como

societário, fiscal, trabalho, contencioso, banca ou propriedade intelectual. A firma norte- americana conta actualmente com mais de 2.000 profissionais em todo o mundo e uma presença em mais de 62 locais em 21 países de quatro continentes.

João Maltez jmaltez@negocios.pt

11 de maio de 2017 às 09:45